terça-feira, 7 de junho de 2016

RELEVÂNCIA DO PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO

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RELEVÂNCIA DO PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO

Celso dos S. Vasconcelos

            Muitas vezes, no dia-a-dia, a preocupação da direção acaba sendo “que a escola funcione”, e a dos professores acaba girando em torno do “manter a disciplina e cumprir o programa”. “O nosso risco, porém, é este: somos devorados pelo urgente e não temos tempo para posicionarmo-nos diante do importante”. Frente a tantas dificuldades, por que a escola deve se interessar pelo Projeto? Ora, a função do projeto é justamente ajudar a resolver problemas, transformar a prática e, no limite, tornar menor o sofrimento.
            O Projeto Educativo não é algo que se coloca como um “a mais” para a escola, como um rol de preocupações que remete para fora dela, para questões “estratosféricas”. Pelo contrário, é uma metodologia de trabalho que possibilita ressignificar a ação de todos os agentes da escola.

C. Wright comparou a situação dos educadores à de remadores, no porão de uma galera. Todos estão suados de tanto remar e se congratulam uns com os outros pela velocidade que conseguem imprimir ao barco. Há apenas um problema: ninguém sabe para onde vai o barco, e muitos evitam a pergunta alegando que este problema está fora da alçada de sua competência. (Alves, 1981:86)

Houve um tempo em que parecia óbvia a necessidade e a finalidade da escola. No entanto, especialmente a partir da década de setenta, com toda a crítica da sociologia francesa, a escola descobre-se como palco de conflitos e contradições sociais. Desde então, a explicitação de seu projeto, do dizer a que veio, vai se tornando cada vez mais importante.

a)    Rigor e Participação

A grande contribuição do Projeto Político-Pedagógico na perspectiva do Planejamento Participativo está no seguinte:

§  Rigor (qualidade formal)

É uma maneira de se enfrentar o processo de alienação, exigindo que as ações sejam intencionais (desligar o “piloto automático”). Há atualmente um apelo muito forte pela “prática”; este apelo pode nos levar ao imediatismo, ao ativismo. É preciso considerar que a prática é fundamental, é a finalidade da instituição, mas, por outro lado, a realidade é complexa, e como tal deve ser enfrentada. O que queremos dizer é que atuar de qualquer forma, sendo condicionado pelas pressões do ambiente (rotinas, ideologias) é fácil; difícil é realizarmos uma ação consciente, que de fato corresponda às reais necessidades. Para isto precisamos de um referencial teórico-metodológico. O Projeto é justamente o Méthodos que visa ajudar a enfrentar os desafios do cotidiano da escola, só que de uma forma refletida, sistematizada, orgânica, científica, e, o que é essencial, participativa.

§  Participação (qualidade política)

Que valor pode ter um pedaço de papel escrito? A teoria quando assumida por um grupo, transforma-se em “força material”. Na elaboração participativa do Projeto, todos têm oportunidade de se expressar, inclusive aqueles que geralmente não falam, mas que estão acreditando, estão querendo. Muitas vezes, não falam por insegurança, por pressão do grupo ou por acomodação, em função daqueles que “sempre falam”. O processo de planejamento participativo abre possibilidade de um maior fluxo de desejos, de esperanças e, portanto, de forças para a tão difícil tarefa de construção de uma nova prática. Almeja-se também a partilha de todos os bens, sejam espirituais (decisão, planejamento), sejam materiais (recursos, lucros, perdas).

b)    A Ética do Projeto

Dado o nível de senso comum que existe hoje, em termos de novas concepções pedagógicas, dificilmente um Projeto expressará uma proposta reacionária, conservadora. Nestes casos, a estratégia dos dirigentes que, com efeito, não querem a mudança parece ser a seguinte: “deixa o povo falar o que quiser; nós escreveremos em termos bem genéricos (“belas palavras”), de forma que não tenha força de cobrança das transformações.
Ao invés, o Projeto Político-Pedagógico, quando feito baseado numa autêntica ética, é um Méthodos de transformação, tendo em vista expressar o compromisso de grupo com uma caminhada. Dessa forma, tanto o dirigente pode cobrar coerência do dirigido, como o dirigido cobrar do dirigente, bem como dos companheiros entre si. Havendo um Projeto, existe maior facilidade em não se tomar as críticas como pessoais (as críticas devem fazer parte do cotidiano, se queremos superar as contradições).

c)    A Autonomia em Questão


Temos afirmado, no decorrer deste trabalho, que o Projeto Político-Pedagógico é um caminho de consolidação da autonomia da escola. Precisamos, no entanto, refletir um pouco melhor sobre isto, sob pena de ficarmos numa visão ingênua.
O questionamento que muitos educadores se fazem é bastante claro: até que ponto a proposta das mantenedoras (sobretudo públicas) de que as escolas agora devem fazer seu projeto político-pedagógico não estaria, na verdade, representando uma estratégia de descompromisso e de transferência de responsabilidade? Seria autonomia ou descaso do Estado? O discurso da autonomia poderia ser uma forte carga ideológica, no sentido de deixar a entender que as escolas, na medida em que têm seus projetos, são responsáveis pelo sucesso ou fracasso de suas práticas...
É certo que este é um risco concreto. Todavia, vai depender muito da maneira como a comunidade escolar vai se posicionar. Quando vemos escolas fazendo projeto “porque o MEC está a exigir”, é claro que não podemos esperar muito diante deste risco de manipulação. Por outro lado, quando a escola despertou para a necessidade de se definir, de construir coletivamente sua identidade e de se organizar para concretizá-la, então o projeto pode ser um importante instrumento de luta e, inclusive, de denúncia, no caso de omissão da mantenedora.
Aquela mesma linha de reflexão que fizemos em relação à condição de sujeito por parte do educador, pode ser aqui retomada quanto à instituição: a autonomia não pode ser outorgada: cabe ser conquistada!

d)    Projeto x Regimento

É preciso que fique clara a distinção entre o Projeto Político-Pedagógico da escola, com o sentido que apontamos acima, e o Regimento Escolar, que é uma exigência legal para o funcionamento da escola (duração dos níveis de ensino, critérios de organização – séries anuais, períodos semestrais, ciclos, grupos não-seriados, etc. -, classificação e reclassificação de alunos, verificação do rendimento escolar, frequência, currículos, etc.). De acordo com a legislação em vigor, a elaboração de ambos é de competência da escola. O que se espera é que o regimento possa ser feito a partir do Projeto, qual seja, ter os parâmetros e princípios do Projeto como referência para o detalhamento administrativo e jurídico (o que nem sempre é possível, pelo menos no todo, em função de diretrizes e normas exteriores à escola).
O que se recomenda é que o regimento seja o mais abrangente possível, delegando a tarefa de definir detalhes para segmentos específicos da instituição (ex.: ao invés de ficar especificando como deverá ser o processo de avaliação de aprendizagem, poderá apresentar os critérios gerais e remeter a definição para o Conselho de Escola ou para o Conselho Técnico-Administrativo). Isto dá mais flexibilidade em termos de reestruturação da prática, sem precisar reelaborar o regimento, pedir nova aprovação, etc.


VASCONCELOS, Celso dos S. – Planejamento – Projeto de Ensino-Aprendizagem e Projeto Político-Pedagógico – 15ª Edição – São Paulo: Editora Libertad – 2006

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